domingo, 24 de outubro de 2010

A VISITA DOMICILIÁRIA NO CONTEXTO DA SAÚDE DA FAMÍLIA*

A VISITA DOMICILIÁRIA NO CONTEXTO DA SAÚDE DA FAMÍLIA*

Autores:
Renata Ferreira Takahashi1

Maria Amélia de Campos Oliveira1
Última Atualização: 9/26/2001 7:31:02 AM


1 Professor Doutor, Escola de Enfermagem da USP
* Disponível em http://ids-saude.uol.com.br/psf/enfermagem/tema1/texto8_1.asp


Introdução
A visita domiciliária (VD) é um instrumento de intervenção fundamental da estratégia de Saúde da Família, utilizado pelos integrantes das equipes de saúde para conhecer as condições de vida e saúde das famílias sob sua responsabilidade. Para isso, devem utilizar suas habilidades e competências não apenas para o cadastramento dessas famílias, mas, também, e principalmente, para a identificação de suas características sociais (condições de vida e trabalho) e epidemiológicas, seus problemas de saúde e vulnerabilidade aos agravos de saúde.

A caracterização das condições de vida e trabalho dessas famílias permite compor os perfis de reprodução e produção, respectivamente, os quais, por sua vez, permitirão conhecer grupos distintos no território, homogêneos em função dessas características identificadas. As condições de saúde, a vulnerabilidade aos agravos e as condições protetoras comporão perfis epidemiológicos desses mesmos grupos sociais.

Certamente, tal caracterização não se esgota na visita domiciliária, pois todos os momentos de intervenção junto a essas famílias permitem aprimorar a captação desses dados. Entretanto, por se dar no domicílio, a visitação possobilita compreender parte da dinâmica das relações familiares.

A visita domiciliária só se configura como parte do arsenal de intervenções de que dispõem as equipes de saúde da família, quando planejada e sistematizada. De outra forma, configura uma mera atividade social.

A territorialidade proposta na estratégia de Saúde da Família deverá eliminar um dos principais impedimentos para a implantação de Programas de Visita Domiciliária em serviços de saúde, que é a disponibilidade de um meio de transporte para o profissional realizar essa atividade.


Conceito e finalidade
A VD constitui uma atividade utilizada com o intuito de subsidiar a intervenção no processo saúde-doença de indivíduos ou o planejamento de ações visando a promoção de saúde da coletividade. A sua execução ocorre no local de moradia dos usuários dos Serviços de Saúde e obedece uma sistematização prévia.

Ela possibilita ao profissional conhecer o contexto de vida do usuário do serviço de saúde e a constatação "in loco" das reais condições de habitação, bem como a identificação das relações familiares. Além disso, facilita o planejamento da assistência por permitir o reconhecimento dos recursos que a família dispõe. Pode ainda contribuir para a melhoria do vínculo entre o profissional e o usuário, pois a VD é interpretada, freqüentemente, como uma atenção diferenciada advinda do Serviço de Saúde.


Objetivos
Eles devem ser estabelecidos considerando o(s) motivo(s) da sua solicitação e estar em consonância com a finalidade para a qual a atividade foi proposta.


Pressupostos
Os pressupostos que orientam a VD são:

nem toda ida ao domicílio do usuário pode ser considerada uma VD; para ser considerada uma VD, tal atividade deve compreender um conjunto de ações sistematizadas, que se iniciam antes e continuam após o ato de visitar o usuário no domicílio; a sua execução pressupõe o uso das técnicas de entrevista e de observação sistematizada; a realização da VD. requer um profissional habilitado e com capacitação específica; na elaboração dos objetivos da VD, é necessário considerar os limites e as possibilidades do saber específico do profissional/técnico que a executará. a relação entre o profissional e o usuário deve estar pautada nos princípios da participação, da responsabilidade compartilhada, do respeito mútuo (crenças e valores relacionados ao processo saúde-doença) e da construção conjunta da intervenção no processo saúde-doença. podem existir diferenças sócioculturais e educacionais entre os profissionais e os usuários dos Serviços de Saúde, que devem ser consideradas no planejamento e na execução da VD; a intervenção no processo saúde-doença pode ou não ser uma ação integrante da VD.


Descrição da técnica de VD
A VD compreende as seguintes etapas: planejamento, execução, registro de dados e avaliação do processo.


O planejamento da VD
É recomendado para que sua finalidade seja alcançada, o profissional atinja o rendimento previsto para a realização dessa atividade e, ainda, para que tenha clareza e segurança no que irá fazer durante a visita.

O planejamento inicia-se com a seleção das visitas, segundo os critérios estabelecidos pela equipe de saúde. É importante considerar o itinerário, o tempo a ser gasto em cada casa e o horário disponível do técnico e do usuário. Colocar em primeiro lugar as VDs em que se gastará menos tempo e deixar por último aquelas que demandam um contato mais prolongado, como é o caso das doenças transmissíveis.

Em seguida, deve-se estabelecer os objetivos da VD, que irão orientar a revisão de conhecimentos necessária para embasar a entrevista com o usuário e a observação no domicílio. Tal processo pode ser realizado através de leitura bibliográfica ou de outras fontes de informação.

Posteriormente, inicia-se a captação da realidade de vida e saúde do usuário e dos seus familiares através da leitura do prontuário e da troca de informações com os profissionais que já tiveram contato com algum membro da família, a fim de selecionar os dados essenciais e pertinentes aos objetivos da visita.

A cada etapa realizada, preencher o impresso utilizado na realização da VD, que deve conter: número de cadastro da família, quem realizou a VD, nome do(s) usuário(s), endereço, objetivos e dados coletados previamente. Se possível, entrar em contato com o usuário antes da realização da VD para agendar a data e o horário.




A execução da VD
Durante a visita, alguns cuidados devem ser observados para evitar que a finalidade da atividade não seja alcançada:

adaptar o plano da VD, no caso de ocorrerem interferências durante sua realização e que podem impedir o alcance dos objetivos, para que na medida do possível as necessidades da família ali explicitadas possam ser atendidas; na chegada ao domicílio o profissional deve identificar-se (nome e função) e expressar de maneira informal mas com clareza os objetivos da visita e ser cordial no relacionamento, evitando os extremos da formalidade e da intimidade no contato com os usuários. Após esse contato preliminar, iniciar a entrevista ou executar os procedimentos previstos, segundo os objetivos propostos para a VD. Se a VD tiver como objetivo a coleta de dados, deve-se explicar o motivo da anotação das informações e destacar o caráter sigiloso do registro.

Durante a VD, realizar a observação sistematizada da dinâmica da família e ao término, o profissional deve resgatar os seus objetivos e fazer uma síntese do que foi realizado (se houve algum tipo de intervenção: procedimento, orientação, encaminhamento, etc) para a família.


Relatório da VD
Ao retornar à Unidade, o profissional deverá elaborar um relatório escrito sobre a VD e anexá-lo ao prontuário do usuário ou utilizar o verso do próprio impresso usado para a realização da VD. O relatório é essencial para que as informações coletadas através da entrevista ou da observação sejam compartilhadas com os membros da equipe e para que não se percam ao longo do tempo, subsidiando a continuidade da assistência à família. O relatório deve ser claro, objetivo, sintético, ter uma seqüência lógica, ser iniciado com as informações colhidas, seguido das observações feitas e, por fim, as intervenções realizadas. Ainda no relatório, deve-se informar as necessidades da família, que ela própria expressa ou que foram detectadas pelo profissional, e registrar, se houver, aspectos que precisam ser explorados no próximo contato com a família.

O relatório deve ser apresentado à equipe, que tomará as providências necessárias para dar continuidade à assistência à família.


Avaliação do processo da VD
A avaliação é necessária para que a equipe estabeleça o "passo seguinte" na assistência à família visitada e também, para que o profissional possa fazer a auto-avaliação na realização da VD (os objetivos propostos foram atingidos ? o preparo para a realização da atividade foi adequado ? o tempo estimado foi cumprido ? os pressupostos da VD foram contemplados ?).



Modelo genérico para a realização da VD
Dados a serem coletados antes da VD:

1. Unidade de Saúde:

2. Data:

3. Equipe:

4. Nome do Profissional:


5. Nome do usuário:




6. Registro:


7. Endereço:




8. Motivo da VD:




9. Objetivos da VD:




10. Dados sobre a família:



11. Atividades a serem desenvolvidas:








12. Registro de dados:











13. Relatório da VD:


Guia para preenchimento dos campos:

1. nome da Unidade de Saúde.

2. data de realização da VD.

3. número da equipe e da micro-área.

4. nome e profissão do técnico que realizará a visita.

5. registrar o nome do usuário que é o alvo principal da VD ou do chefe da família quando se tratar do cadastramento familiar.

6. anotar o número de matrícula do usuário na Unidade.

7. anotar o endereço completo e pontos de referência (estabelecimentos comerciais) que facilitem sua localização.

8. registrar com objetividade o(s) motivo(s) do pedido da visita, o que auxiliará no esclarecimento do usuário sobre a sua nalidade.

9. devem ser estabelecidos tendo como base o(s) motivo(s) da solicitação da VD e devem ser passíveis de serem alcançados.

10. registrar somente os dados pertinentes aos objetivos definidos para a visita.

11.definir o tipo de atividade que será desenvolvida durante a visita, como: coletar dados sobre as condições de vida e trabalho da família (segundo roteiro preestabelecido), demonstrar aplicação de medicamentos ou execução de técnicas, avaliar condições para dar continuidade à assistência.

12. registrar as observações feitas no domicílio e os dados coletados por informações verbais. Podem ser utilizados diferentes impressos, específicos para a finalidade a que se propõe a VD. Para as demais situações, pode-se elaborar outros impressos ou utilizar um modelo genérico que se preste a qualquer situação, como é o caso do modelo aqui apresentado.

13. deve conter uma síntese das informações coletadas, das observações e das intervenções realizadas. O relatório deve contemplar a avaliação da VD, que deve ser feita tendo como referência os objetivos propostos inicialmente. Anotar ainda as impressões sobre o relacionamento estabelecido com a família e as necessidades identificadas ou relatadas pelo usuário ou por seus familiares.


Bibliografia

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EGRY, E.Y. & FONSECA, R.M.G.S. A visita domiciliária enquanto modalidade assistencial da enfermagem em saúde coletiva. Rev. Esc.Enf.USP (no prelo)

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MISOCZKY, M.C. A medicina de família: os ouvidos do príncipe e os compromissos com o SUS. Saúde Deb., n.42, pp.40-4, 1994.

CORDEIRO, H. Os desafios do ensino das profissões da saúde diante das mudanças do modelo assistencial": contribuição para além dos pólos de capacitação em Saúde da Família. Div.Saúde Deb., n.210, pp.36-43, 2000.

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